quinta-feira, 19 de julho de 2012

SURREALISMO & SURREALISTAS-6


1-6 -datas-md-ls- s-datas- segunda-feira, 24 de Junho de 2002

1942-1966 :
CRONOLOGIA INCOMPLETA DO SURREALISMO
EM PORTUGAL (*)

1942 - O ano de 1942 é a data mais recuada que se conhece nos fastos do surrealismo em Portugal.
Segundo rezam as crónicas, reunia-se por essa altura no Café Herminius, de Lisboa, um grupo de rapazes: Leonel Martins Rodrigues, Pedro Oom, Mário Cesariny de Vasconcelos, António Domingues, Fernando Azevedo, José Francisco, José Cardoso Pires, Artur do Cruzeiro Seixas, Júlio Pomar, João Moniz Pereira e Marcelino Vespeira.

1947 - Cinco anos iriam passar-se; em 1947, início da guerra fria, chega a Portugal a «Histoire du Surréalisme», da Maurice Nadeau.
Constitui-se a Grupo Surrealista Português.

1948 - Cesariny sai do referido Grupo.
Em Dezembro deste ano, um dos primeiros artigos sobre surrealismo na Imprensa portuguesa: «O surrealismo contra a literatura», de Adolfo Casais Monteiro in «O Primeiro do Janeiro».

1949 - A propósito da 1ª Exposição de Surrealistas, realizada na Rua Ivens, de Junho a Julho, Jorge de Sena provoca o Grupo em artigos da «Seara Nova» (Junho), e este ano iria ser um dos mais vivos do surrealismo em Portugal.
O manifesto «Erro Próprio» foi lido pelo seu autor - António Maria Lisboa -, numa sessão para a qual o comité organizador convidou G. Simões, Casais Monteiro e outros presencistas que, desta vez, primaram pela ausência.
Mas Simões, no jornal «Sol» (Julho), fala dos cadernos surrealistas (do já então dissidido grupo, pseudo-surrealista, com França, A. Pedro e O'Neill à cabeça) e, no mesmo jornal, os atingidos - O'Neill e J.A. França -, respondem .
Em Setembro, Simões replica e em Outubro, dia 1, os dois outros triplicam, tudo isto no referido «Sol»..
Nesta data, P. Oom e M. Cesariny intervêm na disputa com um comunicado a explicar que não tinham nada com a zanga; em Novembro, outro comunicado de M. H. Leiria, Cesariny, J. ª Silva, A . do Cruzeiro Seixas e C.E. da Costa, para fulminar os já então surrealistas dissididos J. A. França e A. Pedro.
O ano do 1949 termina assim em beleza.

1950 - Começou ardente, mas não manteve o élan.
Nora Mitrani, a convite dos dissididos, profere para alguns portugueses, no J. U. B. A. (Jardim Universitário de Belas Artes), um dos textos mais lúcidos e significativos que sobre surrealismo se viram impressos em língua portuguesa. «A Razão-Ardente» saía depois em opúsculo, editado pelo Cadernos Surrealistas, dirigidos por França.
Em 25 de Abril, M.H. Leiria, J. A. Silva e A. do C. Seixas lançam a «Comunicado dos Surrealistas Portugueses» e, em 1950, foi tudo.

1951 - De Outubro a Dezembro, multiplicam -se as manifestações surrealistas: M. H. Leiria, Cesariny , C. E. da Costa e A . do C. Seixas assinam «Evidência Surrealista», e os dois primeiros, logo a seguir, «para bem esclarecer as gentes que ainda estão à espera, lançam novo panfleto.
Em 11 de Novembro, A. O'Neill entendeu estar a tempo de dar nas vistas, acentuando a sua cisão com o grupo em «Tempo de Fantasmas», plaqueta que sai, apesar da cisão, nos «Cadernos do Poesia» (nº 11), inspirados e editados por França e arredores.
Em Dezembro, M.H. Leiria e H.R. Pereira ministram novo banho a Simões em opúsculo intitulado «Mais um Cadáver». Ainda no mesmo frígido mês de Natal, os mesmos e mais Cesariny, A. M. Lisboa, C. E. da Costa, F. A. dos Santos e A . do C. Seixas resolvem aquecer publicando «Do Capítulo da Probidade» (folha volante).

1952 - Ano próspero.
A. M. Lisboa, meio morto no Sanatório da Quinta dos Vales (Coimbra) edita, naquela cidade, «Erro Próprio» e «Ossóptico».
O ano abriria bem, em Janeiro, com um selecto manifesto doutrinário que deveria ter sido colectivo e acabou por ser redigido só por M. H. Leiria. Homem e Sociedade, fragmento tornado público do que teria sido o «Manifesto Colectivo dos Surrealistas Portugueses».
A 2 de Fevereiro, «A Semana», jornal das direitas, publica artigo de António Quadros: «Do Real do Realismo, ao Real do Surrealismo» e, em 2 de Setembro, Cesariny iniciava, em outro semanário - «Cartaz» - interessante colaboração sobre pintores, incluindo Malhoa, Amália e Vieira da Silva.
Em Outubro, a revista «Contraponto» simpatizava com o surrealismo e, no n.º 2, Tomás Ribas criticava um livro de Cesariny.
D. M. Ferreira dignava-se conspurcar a toga e na tribuna do «Diário Popular» disse o que sabia sobre «Discurso Sobre a Reabilitação do Real Quotidiano», recém-saído neste ano.
Ainda este ano, um dos mais assíduos signatários de manifestos surrealistas, botava livro poemático: «Sete Poemas da Solenidade e um Requiem»: C. E. da Costa.

1953 - Luís Pacheco agita as edições «Contraponto», onde os surrealistas vão quase todos ver a luz: em Julho, aparece, póstumo e a copiador, o «Aviso ao Tempo por Causa do Tempo»,- e, tipografado, o «Isso Ontem Único», de A. M .Lisboa - que falecia a 11 de Novembro em Lisboa, cidade onde nascera a 1 de Agosto de 1928 (1928-1953).
Ainda com chancela «Contraponto»: «A Afixação Proibida», por P. Oom, H. R. Pereira, Cesariny e A. M. Lisboa, o último texto, portanto, que este último assinaria e talvez o primeiro em grupo.

1954 - Este ano apenas assinalado com um livro «Contraponto» da autoria de um dos signatários surrealistas: «Diário Flagrante», de F. A. Santos.

1955 - Em .21 de Abril, Alfredo Margarido concorre com artigo no «Diário de Notícias»: «Para uma História do Surrealismo Português», artigo que nos foi proveitoso nesta resenha cronológica.
A 13 de Maio, no «Jornal de Notícias» (Porto), José Marmelo e Silva intervinha, em nome do neo-realismo ofendido, a reclamar contra a subversão «surrealista», o que, evidentemente, foi muito aplaudido pela galeria. Intitulava -se o artigo: «Uma «Academia dos Generosos» modernista ou a Equívoco do «Grupo Surrealista de Lisboa».

1958 - Mal a fúria de J. M. e Silva foi conhecida, em Lisboa, logo Agostinho Veloso S.J.. acusou «A Farsa Surrealista», na revista «Brotéria», ao que Afonso Cautela, no jornal «A Planície», em 1 de Maio, pôs os pontos nos iis.
Na mesma data e neste mesmo jornal., A . Margarido assinava artigo «A propósito do Surrealismo».
É de 1958, «A Verticalidade e a Chave», póstuma de A .M. Lisboa.

1957 - Ano das colaborações de Cesariny, a pleno vapor, no suplemento «Dialogo», crónicas anacrónicas de vivo sabor, que o tornaram, conhecido, também na província.

1958 - Cesariny continua em «Diálogo» a falar até de Maldoror e, estimulado pelo êxito, propõe-se uma ruína editorial: «A Antologia em 1958», colecção de livros, na qual vão sair textos de A . M. Lisboa, Luís Pacheco, Natália Correia, Virgílio Martinho e António José Forte, além do editor, Cesariny.
Ernesto Sampaio revelava a sua verve crítico-poético-mística em livro - «Luz Central» - e Afonso Cautela, mais ou menos por essa altura, refere-se-lhe em termos elogiosos tais que provocaram a sanha do Dr. João Palma-Ferreira, que logo dispõe as baterias no «Diário Popular», onde teria havido polémica sobre assunto capital, se o jornal não fosse fechado às réplicas do agredido, contrariando as regras da mais elementar deontologia jornalística.
Deste incidente, resultou ainda, na série negra da «Antologia em 1958», um opúsculo de Pedro Oom, «Uma. Carta para Palma-Ferreira» e, na revista «Pirâmide», um ano mais tarde, uma carta de Ernesto Sampaio que só serviu para atestar o baixo estofo " moral “ de um sujeito que proclama ética aos quatro ventos.
A polémica, aliás, não ficou encerrada (nem sequer encetada) e marca por isso um triste episódio da Polémica Geral em que o surrealismo se viu enredado neste rectângulo florido à beira mar mal disposto. Para dar notícia, crónica e breve, dessa Polémica, se perdeu tempo a coligir os nomes e datas da presente relação.
É de Maio, a folha volante de Cesariny que fez época, intitulada: «Autoria e Liberdade são uma e a mesma coisa».
A 16 de Outubro, Benjamim publica o desenho Café Gelo (in «Diário de Lisboa»), valioso documento para a iconografia surrealistas em Lisboa-Rossio.
No mesmo jornal, artigo de Cesariny sobre A. M. Lisboa, a 11 de Dezembro.

1959 - Cheio que nem um ovo de coisas surrealistas é o ano de 1959.
Cesariny continua a sua colaboração em «Diálogo» e, enquanto isso, no mesmo suplemento do «Diário Ilustrado», A. Margarido, por várias alturas, pronunciou, do alto da sua tribuna crítica, veredictos: em 28 de Maio ao livro «Festa Pública», de V. Martinho e a «Carta-Sincera para José Gomes Ferreira», de L. Pacheco; a 1 de Agosto, sobre «Pirâmide» 2, saída em Junho, e «Pirâmide» 1, saída em Fevereiro; a 5 de Setembro, sobre o livro «Nobilíssima Visão».
No mesmo «Diálogo», Luís Pacheco critica a 2 de Maio o Picto-abjeccionismo de Cesariny e, a 9 de Maio, Virgílio Martinho assina o artigo «Do Surrealismo até à Presença de Mário Cesariny de Vasconcelos» e, a 22 de Agosto, J. P. Ferreira, que não desiste, arremete Sobre dois livros Surrealistas: «Mitos Maiores e Menores», de Cesariny e «Alfred Jarry», de A. M. Lisboa.
Cesariny não tem mãos a medir: publica «Nobilíssima Visão», fala de «A Crítica com que nos ocupam» (In «Diálogo», 21 de Fevereiro), dá entrevista a Portela Filho (in Diário do Lisboa, 3 de Abril) e a Maria Virgínia de Aguiar (in «Diário Ilustrado», 14 de Maio), esta por altura da sua exposição de pintura na galeria Divulgação do Porto. Ao «Diário de Lisboa» envia ainda uma carta sobre «O Surrealismo e a Enciclopédia Portuguesa e Brasileira», que sai a 16 de Abril.
Livros: «Para uma Cultura Fascinante», de Ernesto Sampaio e «O Planeta Precário», de José Sebag.
Artigos a registar: o de Simões In «História da Poesia Portuguesa do Século XX», o de A. Margarido, a 30 de Maio, «Do Surrealismo à Sociologia» (in «Diálogo»), o de Luís Pacheco, «Surrealismo e Sátira (de
André Tolentino a Nicolau Breton)». (in Pirâmide 1), o de Virgílio Martinho, em forma de entrevista (in «Diálogo», 4 de Julho).
Incidente a registar: a 23 de Abril, em «Jornal de Notícias», o depois falecido António Ramos de Almeida chama a guarda por causa de um poema de Pedro Oom, «Um Ontem Cão» e a coisa complica-se com respostas e contra-respostas. A guarda não apareceu.

1960 - Além de «Pirâmide» 3, que deu berro em Dezembro, só a lembrar este ano, a versão, prefácio e notas de Cesariny de «Une Saison en Enfer», de Rimbaud.
Em «Pirâmide» 3, Carlos Loures assina artigo: «Aos Ladrões de Fogo - Poesia, Surrealismo, Controle».

1961 - A intensa actividade de Cesariny dos três anos transactos culmina em 1961: com a publicação do volume «Poesia», editado na Delfos e que compila 11 anos de poemas (1944-1955); com o livro «Planisfério», editado em Julho; com uma «Antologia Surrealista do Cadáver Esquisito».
De 9 a 15 de Março, por sua iniciativa, realiza-se na Associação dos Estudantes do I.S.T. uma exposição sobre A. M. Lisboa, por altura da qual saiu publicado um texto, até aí inédito, do poeta (in «Diário de Lisboa», 9 de Março), acompanhado de artigo informativo de A. Margarido e depoimentos de A. O'Neil, C. C. Pinto. F. Namora e V. Ferreira. sobre o que entendiam (sic) por surrealismo. Claro que todos mostraram não entender patavina.
Inesperadamente, António Aragão fala «Do Surrealismo e Sua Actualidade» in «Comércio do Porto», 10 de Outubro) e Natália Correia cede entrevistas ao «Jornal de Letras e Artes», a 22 de Novembro.
Gastão Cruz, no artigo sobre livro «Planisfério» (in Jornal de Letras e Artes, 8 de Novembro), mostra quanto o surrealismo serve a todos.
Um livro de V. Martinho: «Orlando em Tríptico e Aventuras».

1962 - A iniciativa de Cesariny continua a marcar o único surrealismo visível: compila os versos de A. M. Lisboa no livro Poesia, alguns ensaios sob o título geral de um deles: Erro Próprio, edições que saem com chancela da Guimarães Editores.
Cesariny é entrevistado para «J. de L. e A .» (29 de Agosto) onde publica artigo «Quatro Notas sobre a Ausência do Rimbaud», a 14 de Novembro, e uma página antológica «Surrealismo-Abjeccionismo», a 17 de Janeiro.
V. Martinho concede entrevista ao Jornal «República», a 14 de Dezembro.
Como toda a gente falava, J.P. Ferreira referiu-se aos livros de A. M. Lisboa (in «Diário Popular», a 14 de Junho) e Álvaro Salema também (in «Diário de Lisboa», 17 de Junho).
António Ramos Rosa reuniu em livro - «Poesia, Liberdade Livre» - alguns artigos onde testemunhara inquietações análogas às surrealistas, embora as suas conclusões - muito informadas nas fontes francesas - nada se identifiquem com uma atitude surrealista ou pró.

1963 - Logo a 9 de Janeiro, Reis Brasil diz o que lhe parece sobre «As Determinantes do ideal Super-Realista», em artigo que «O Primeiro de Janeiro» alberga.
A 30 de Março, na Casa da Imprensa, a propósito da antologia «Surrealismo-Abjeccionismo» que Cesariny vinha organizando e a tipografia desorganizando há anos, realiza-se uma sessão para serem lidas comunicações de António Areal, Afonso Cautela, Ernesto Sampaio, Fernando Alves dos Santos, Manuel de Lima, Cesariny, Pedro Oom, alguns deles surrealistas e outros abjeccionistas, outros nem uma coisa nem outra e outros ainda as duas coisas.
A comunicação de Ernesto Sampaio, saiu publicada no semanário «Noticias da Amadora», meses depois. A 12 de Maio, «Jornal do Fundão» dedica ao assunto duas páginas com artigos de A . Margarido e A. Cautela. A 9 de Maio, Simões diz de sua justiça (Diário de Notícias): mostra, mais uma vez, não ter percebido.
A 16 de Maio, um artigo sobre a antologia em Jornal de Notícias, Porto, assinado por A. Cautela, que escreve no mesmo jornal sobra «O Surrealismo e o que se Traduz».
Na «série negra» da referida Antologia em 1958 aparece o artigo «A Filosofia e a Arte Perante o seu Destino Revolucionário, de Jean Schuster - Gérard Legrand, que, traduzido por Luís Pacheco, deu propósito a que Afonso Cautela inserisse em 14 de Agosto (in «Jornal de Letras e Artes») um artigo longo intitulado : «O Surrealismo é uma filosofia?»
A 6 de Novembro Fernando Barros ataca o artigo e o autor (mais o autor que o artigo) no mesmo jornal, ao que A . C. replicava a 4 de Dezembro. Enquanto isto, publicava o artigo «Realismo Fantástico - Parêntesis ou Ponto Final no Surrealismo» («Diário de Noticias», 25 de Julho), encerrando-se este ano fatídico do surrealismo em português.

1964 - A Associação do Instituto Superior Técnico edita em opúsculo as conferências, ali realizadas, entre as quais a de Ernesto Sampaio, sobre surrealismo, texto imprescindível, num compilação de textos portugueses sobre Surrealismo que urge fazer (e editar),
A 30 de Novembro, um artigo de A. Cautela no jornal «República» sobre «Uma Informação de França sobre Surrealismo em Portugal», onde se denuncia o equívoco do historiador francês Jean Louis Bédouin que se referira ao surrealismo em Portugal com base nas infidedignas palavras de um seu apóstata: José Augusto França.

1965 - Livro « A Cidade Queimada», de Cesariny, edição Ulisseia de 300 exemplares: com ilustrações de A. do C. Seixas.

1966 - Talvez o mais valioso documento, não do surrealismo mas do abjeccionismo português, «Crítica de Circunstância», de Luís Pacheco, participante como editor dos feitos surrealistas. Devem-se-lhe os textos (folhas volantes) mais curiosos sobre actividades surrealistas aqui supostas ou acontecidas, sempre mordazes pela anedótica ambiguidade e pelo escárnio implacável. .
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(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado, em 6/2/1972, no Jornal «Diário de Coimbra», no suplemento literário dirigido por José Matos-Cruz■

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